24 de janeiro de 2010


COADJUVANTE
Jenário de Fátima


Como é doído ver o quanto esquivas.
Quando juntos estamos num abraço.
Sinto que sutilmente busca espaço
Em outros pares de feições mais vivas.

E disfarçando vou tua recusa,
Amarelando o riso de meus traços,
Enquanto alegremente noutros passos
Tu rodopias pela luz difusa....

Mas se a madrugada esvazia a festa.
E se já há dia pelo céu lá fora,
A mim de novo teu olhar empresta,

A mim de novo buscas sem demora.
Porque a mim somente um papel resta....
Resta o papel de te levar embora...

AVISO
Jenário de Fátima


Ninguém amou da forma que eu amei...
Gostar como eu gostei, ninguém gostou.
Porém, somente foi quando acabou,
Que mesmo tão perdido, eu me encontrei.

De tudo aquilo que fantasiei,
Dos mundos onde meu sonhar andou,
Apenas, tão somente, só guardei
As bases da estrutura do que ora sou.

Tenho um olhar hoje mais que duro
Às vezes antevejo até no escuro
Coisas que, no amor, sei, não tem jeito.

Então eu abro a face e num sorriso
Entendo que aquilo é um aviso
De que já não me cabe dor no peito.

22 de janeiro de 2010

ÚLTIMA MORADA
Jenário de Fátima


Olhando à noite no universo escuro,
As luzes que faiscam no infinito.
Vejo naquele brilho tão bonito
A paz que tanto anseio e que procuro.

Eu que sempre fui fraco, inseguro
Que por coisa qualquer tremo, me agito
Me sinto extasiado quando fito
A casa que me espera no futuro.

Ali não se haverá mais amarguras,
Por entre supernovas e quasares,
No topo de imensuráveis alturas

Buscando galáxias misteriosas,
Minh´alma voará céus estelares
Coberta pelo pó das nebulosas.
DESPERDÍCIO
Jenário de Fátima


Como é doido tanto amor no peito.
Guardado a espera de que alguém o queira.
Preso, estocado pela vida inteira
Armazenado sem nenhum proveito.

Porque será que é sempre deste jeito?
Porque será que justo quem mais ama,
Quem tem o amor como uma ardente chama
Nunca usufrui o que é seu por direito?

Porque será que a vida não dá chances
A quem procura tão somente as cenas
D'algum amor igual ao dos romances?

Sei não... Só sei que isso tudo finda um dia,
Ao ver que amor assim existe apenas
Nas rimas que um poeta fantasia!
MOMENTOS
Jenário de Fátima


Muito mais que as palavras excitantes,
Que ousamos trocar todo momento.
Muito mais que este deslumbramento,
Tão comum a loucura dos amantes.

Muito mais que o delírio dos instantes
Que me ocupa e me toma o pensamento.
Muito mais que os sonhos delirantes
Que passeiam pelos versos que invento.

Muito mais que isso tudo que me toma.
Isso tudo que adere, gruda, soma,
Ao desejo que alflora entre nós dois.

É a certeza do que conta é o presente.
Porque o resto assim pura e simplesmente
Simplesmente, a gente deixa pra depois!

MEL
Jenário de Fátima


Vou roubar seu beijo, ora se vou!
Quero ficar com ele guardadinho...
Prá nestas horas que me achar sozinho
Lembrar do gosto com o qual me beijou.

Talvez até pareça, mas não sou
Alguém que viva sem o seu carinho
E vou ficando emburrado, de beicinho
Quando perto de tí não mais estou...

Este versos são simples, e dai?
Na mesma intenção que os escrevi
Também se faz crescer o meu desejo...

De ter de novo aquela coisa doce
Que quando eu provei julguei que fosse
Um mel vindo na lingua de teu beijo...

14 de janeiro de 2010


VALE A PENA
Jenário de Fátima


Eu amo um alguem que nem sequer me olha,
Que não se importa ao que se dá comigo.
Sou feito a flor que o vento mau desfolha
E vai cair na laje de um jazigo.

Sou qual perfume que só se desrolha,
Pra relembrar-se de um amor antigo,
Sou a gotícula que a terra molha,
E some em terra como por castigo.

Mas mesmo assim, dentro em mim existe
Um anjo que não chora ou se apequena.
Se não me alegro, tambem não sou triste

Não trago voz que julga, que condena
Pois la no fundo, algo me diz, insiste
Que o amor por mais que doa, vale a pena!
MINÚCIAS
Jenário de Fátima


Amor é fragil, sentimento leve.
Igual ao vinho que se prende à rolha,
Igual à brisa que bate na folha,
Igual à queda do floco de neve...

São das minúcias que o amor escreve,
Que a gente vai fazendo cada escolha,
Já que por elas uns têm vida breve,
Qual breve é a vida do sabão na bolha...

Entre os detalhes e as coisas pequenas,
As que se veem nas repetidas cenas,
Aquelas já tão comuns e tão banais...

Que a gente sabe que se segue em frente
Ou, então, se diz de-fi-ni-ti-va-men-te:
"Agora já chega, basta, não dá mais..."
LEVE CANTO
Jenário de Fátima


Pelo negroso desta noite feita.
Chega uma horrenda figura de fera.
Vida de antiquíssima, de remota era
Que de tocaia, me espiona, espreita...

Enquanto a foice ela, calma, ajeita
Ao seu redor um brilho reverbera
Sinto-a somente apenas na espera
Pelo momento em que serei colheita...

Mas eu, embora em visivel pranto
Ainda rezo em prece e nesta hora
Na voz do vento eu ouço leve canto.

A fera se assunta, grunhe, e vai embora
E eu adormeço ao embalo do acalanto
Na voz pausada de Nossa Senhora...

CICATRIZES
Jenário de Fátima


Componho músicas pra ninguém ouvir
Faço poemas que ninguém vai ler
Pinto aquarelas que ninguém vai ver
Conto piadas pra ninguém sorrir.

Minhas carícias ninguém vai sentir
Da minha angústia ninguém vai saber
Os meus soluços ninguém vai conter
Com meu arrolo ninguém vai dormir.

Mas não é egolatria isso que carrego
Nem são egoistas os meu olhos baços
Se a solidão agora me entrego.

É porque o medo me jogou sem laços
Pois do amor apenas só carrego
As cicatrizes de seus estilhaços.
ESCOLHAS
Jenário de Fátima


Briguei com a garrafa e saca rolhas
Já não me entrego ao sabor do vinho,
Cá no meu quarto, eu, triste e sozinho
Escuto o vento assoviar nas folhas...

A vida é toda feita de escolhas
Por elas escorrem tantos caminhos
E neles voamos qual passarinhos
Ou o sabão das coloridas bolhas...

Quero um poema que me salve o dia
Ou o pensar da doce fantasia
Que mais pareça um conto de fadas.

Pra que eu liberte isso de ser triste
Pra que eu não lembre que ainda existe
Angústias em minh'alma atormentada.